ROZEMBERGUE MARQUES*
A história da pediatra Zilda Arns, cuja morte completa 13 anos, se confunde com a história do Terceiro Setor no Brasil. Foi a fundadora da Pastoral da Criança, organismo ligado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e que ganhou dimensão internacional pelas experiências e práticas concretas de proteção e cuidado com essa faixa etária da população brasileira. A médica esteve em Dourados em 2005, sensibilizada com as manchetes nos meios de comunicação nacionais e internacionais sobre os casos de desnutrição nas aldeias Jaguapirú e Bororó e que motivaram a criação de duas Comissões Parlamentares de Inquérito, uma na Assembleia Legislativa e outra na Câmara dos Deputados.
Doutora Zilda veio aqui apresentar a multi-mistura, a "farinha social" de fácil composição e que tem salvado vidas em todo o mundo. Morreu defendendo a causa pela qual viveu: encontrava-se em Porto Príncipe, no Haiti, em missão humanitária, para introduzir a Pastoral da Criança no país. No momento em que estava discursando e as paredes da igreja desabaram por conta de um terremoto, a médica estava no último parágrafo de um discurso, que ela não chegou a terminar, e no qual falava da importância de cuidar das crianças "como um bem sagrado", promovendo o respeito a seus direitos e protegendo-os, "tal qual os pássaros cuidam dos seus filhos".
Zilda Arns e a Pastoral da Criança representam a importância do chamado Terceiro Setor: grupos de pessoas abnegadas que dão o melhor de si para levar conforto material, espiritual e social a parcelas da comunidade onde a "mão" dos poderes públicos não chega ou atuam de forma complementar ao trabalho por eles desempenhados, através de convênios/repasses de recursos.
Entidades como a Creche André Luiz, o Centro Social Marista, os Grupos Escoteiros São Jorge e Laranja Doce, o Centro de Integração do Adolescente (CEIA), Sociedade Pestalozzi, Sociedade Caritativa e Humanitária (SELETA), Rotary, Lyons, Centro de Reabilitação Novo Olhar, a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE), o Lar Santa Rita de Cássia e tantas outras que atuam em nossa cidade estão frequentando os gabinetes dos vereadores em busca de Emendas Impositivas (aquelas que a Prefeitura é obrigada a aplicar) para poderem fazer frente a seus custos, que não são poucos. Há também um movimento pela ampliação das parcerias existentes entre os Poderes Públicos e estas e outras entidades, com um aporte maior de recursos para que elas continuem cumprindo a missão social a que se propuseram.
O Terceiro Setor, porém, não pode ser visto como a solução final para todos os problemas sociais, caso contrário se estaria retirando a responsabilidade dos governos de apresentar respostas às necessidades e desejos das populações. Contudo, é nele que se apresenta uma saída viável, devendo tanto Estado quanto iniciativa privada se espelharem para ações sociais, montando parcerias com ONGS, entidades sociais e até mesmo criando suas próprias instituições.
A ampliação dessas parcerias seria um reconhecimento às instituições, entidades e Organizações Não Governamentais que, assim como à grande brasileira que foi Zilda Arns, se dedicam ao próximo. Esse reconhecimento era inclusive um desejo da doutora Zilda, que sempre ponderava: "Há muito que se fazer, porque a desigualdade é grande. Os esforços que estão sendo feitos precisam ser valorizados para que gerem outros ainda maiores". Lá do céu, a brasileira que com algo tão fácil (uma mistura de farinha e água) veio aqui matar a fome de nossas crianças índias, agradeceria.
*JORNALISTA E VIOLEIRO
Redação Midia MS Digital/ Jornalista Rozembergue Marques