ROZEMBERGUE MARQUES*
Um estudo realizado no ano passado pelos professores Doutores Yzel Rondon Súarez e Alessandro Minillo em três microbacias da cidade de Dourados (Engano, Água Boa e Curral de Arame) detectou que todos esses córregos urbanos possuem resíduos de fármacos/medicamentos no ambiente aquático, incluindo analgésicos (Diclofenaco, Naproxeno e Ibuprofeno) e hormônios femininos, oriundos do uso de anticoncepcionais. Os dois profissionais possuem credenciais de peso, o que o faz muito respeitados na comunidade acadêmica. Yzel, por exemplo, é biólogo, Doutor em Zoologia pela UNESP/Rio Claro e professor da UEMS desde 1998. Trabalha principalmente com ecologia/biologia de peixes, bem como com as respostas dos peixes à perda de integridade ambiental em ambientes aquáticos. Seu colega Alessandro é oceanógrafo, Doutor em Engenharia Ambiental pela USP-São Carlos e bolsista de Pós-Doutorado no Programa de Pós-Graduação em Recursos Naturais da UEMS. Trabalha principalmente com ecotoxicologia ambiental voltada à qualidade da água. Nesta entrevista os dois professores detalharam o estudo, suas consequências e alternativas para evitar um aumento do problema.
Os estudos detectaram, além dos resíduos de fármacos/medicamentos citados acima, a contaminação por cafeína, componente que está presente em um número grande de remédios.Mesmo riachos nos quais se achava estraiam menos afetados(como o Curral de Arame) já possuem resíduos destes fármacos.
Esses remédios ou seus compostos, mostrou o estudo, chegam ao leito ou às margens dos córregos de várias maneiras."Em linhas gerais existem várias possibilidades de entrada no ambiente aquático, como fábricas de produtos farmacêuticos que descartam os resíduos inadequadamente, mas especificamente na área que estudamos a contaminação pode ser proveniente do uso pelas pessoas e posteriormente pela excreção (fezes e urina) que acaba levando estes fármacos para o lençol freático e consequentemente aos riachos", explicou Dr .Ytzel. "Também tem o uso dos remédios pelo gado, além de criações de suínos, aves e peixes, que será eliminado nas fezes e urina e, assim como das pessoas, acaba chegando nos rios", acrescentou o biólogo/professor, ressaltando que descarte inadequado de remédios vencidos ou que sobraram diretamente no lixo leva estes contaminantes aos rios e que mesmo em áreas que possuem esgoto tratado ocorre esta contaminação, uma vez que o sistema tradicional de tratamento de esgoto não é planejado/construído para esta finalidade específica, tornando é insuficiente para remover estes remédios que acabam chegando aos rios, riachos e lagos também.
Sobre o que esses resíduos de remédios causam nos peixes ou quando ingeridos pelo seres humanos, o estudo mostrou que cada fármaco pode ter um efeito diferente."Os hormônios provenientes dos anticoncepcionais podem causar feminilização em peixes e anfíbios, ou seja, fazem com que indivíduos que deveriam se desenvolver como machos acabem se tornando fêmeas. Estes hormônios também podem causar aumento de casos de câncer de mama e de próstata em seres humanos". observaram.
"Analgésicos como o diclofenaco e ibuprofeno causam danos genotóxicos e neurotóxicos em várias espécies. Antibióticos alteram a composição das bactérias que naturalmente ocorrem no ambiente, mas também podem bioacumular em peixes e, quando usados em nossa alimentação podem causar sintomas alérgicos e mesmo gerar bactérias mais resistentes a estes remédios", prossegue o estudo.
Os dois professsores ponderaram que do ponto de vista de conservação da biodiversidade aquática, estes fármacos alteram de várias formas o desenvolvimento dos animais, causando deformações, afetando a fisiologia e, portanto, alterando suas abundâncias na natureza, o que interagindo com outras fontes de impacto (desmatamento, queimadas, etc?) gera uma ameaça ainda maior à conservação da biodiversidade e aos serviços ecossistêmicos que estes organismos nos prestam. "Cada remédio tem efeitos distintos/diferentes em diferentes grupos animais e de plantas, então citamos aqui alguns exemplos que ocorrem em peixes, anfíbios, mas que também afetam os seres humanos. Cabe destacar que alguns fármacos que detectamos estavam em quantidades muito baixas e com grande variabilidade ao longo das áreas amostradas e ao longo do ano, portanto não foram foco do nosso trabalho", frizaram.
Para os professores que assinam o estudo o meio de descarte correto de remédios que sobram de tratamenios ou tem prazo de validade vencido é em locais previstos com esta finalidade, como estações coletoras em farmácias e supermercados cadastrados no programa descarte consciente https://www.descarteconsciente.com.br/.
Medidas simples como estas podem, segundo eles, evitar que estes contaminantes, jogados no lixo, contaminem o lençol freático e consequentemente os rios. Além disso, a mudança na forma de tratamento do esgoto é uma alternativa, mas implica em gasto maior neste processo, o que acaba chegando à população e, portanto, não é muito bem aceito pela população.
Os professores finalizam com uma proposta efetiva para evitar que o problema se prolifere: "Ações conjuntas com a participação da sociedade civil, poder público/governo e iniciativa privada devem ser trabalhadas em campanhas de esclarecimento para o enfrentamento do problema", defendem.
*JORNALISTA E VIOLEIRO - FOTOS: MARIA EDUARDA BARROS
Fonte: Redação MS WEB RADIO/ Jornalista Rozembergue Marques - FOTOS: MARIA EDUARDA BARROS