O ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral estĂĄ condenado a 425 anos de prisão pela prĂĄtica de crimes maciços de corrupção — provavelmente, um recorde mundial em matéria de roubalheira, em qualquer época e em qualquer lugar do planeta. Alguém seria capaz de citar um caso igual? HĂĄ uma montanha de provas materiais contra ele. O ex-governador confessou livremente seus crimes — a um certo momento, chegou a revelar em juízo, em depoimento público e assistido por seus advogados, que era "viciado" em roubar. HĂĄ testemunhas. HĂĄ delações. O que mais faltaria, então, para o sistema judicial brasileiro declarar que ele é culpado e tem de ficar na cadeia? Falta tudo, pelo jeito. Tanto falta que o Supremo Tribunal Federal, em mais uma dessas decisões que fazem a Justiça brasileira de hoje ser um espanto de categoria mundial, mandou soltar Sérgio Cabral — sim, até Sérgio Cabral, em pessoa. Nada do que ele fez foi considerado suficiente para nossa "suprema corte" achar que deveria continuar preso.
O ex-governador não foi absolvido de nenhum dos crimes que lhe renderam os 425 anos de prisão — foi solto por uma trapaça jurídica em estado bruto, como vem acontecendo com todos os corruptos brasileiros que foram pegos nas operações anticorrupção que, por um curto espaço de tempo, ameaçaram mudar para melhor a vida política deste país. Hoje elas estão extintas, mortas e enterradas. Os criminosos estão todos soltos, beneficiados por miudezas insanas dos procedimentos judiciais. Juízes e promotores que atuaram contra a corrupção são perseguidos e punidos. Advogados de corruptores confessos, que inclusive devolveram dinheiro roubado, ganham postos no novo governo Lula. O STF manda soltar, ou anula os processos, ou "descondena" sistematicamente todo e qualquer acusado de corrupção que recorra a seus serviços e que tenha as bençãos do "campo progressista". Naturalmente, nenhuma das garantias dadas aos ladrões do ErĂĄrio vale para os cidadãos comuns acusados de "atos antidemocrĂĄticos" ou "atentados ao Estado de Direito"; esses são presos quase diariamente, sem nenhum tipo de respeito ao processo legal, e não tĂȘm direito nem a advogado, ou a saber os crimes de que são acusados perante as leis em vigor no país. Nessa falĂȘncia múltipla e progressiva do sistema brasileiro de Justiça, ficou assim: se vocĂȘ protesta na frente do quartel, vai preso; se vocĂȘ tem 425 anos de pena a cumprir por corrupção, o STF manda soltar.
Esperar o que de diferente, na verdade, de um país no qual o cidadão que o TSE declarou vencedor da última eleição presidencial foi condenado pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, em trĂȘs instâncias e por nove juízes diferentes? Por que Sergio Cabral teria de ficar na cadeia e Lula solto — solto e presidente da República? O STF, a cada dia, faz questão de deixar oficialmente claro que a corrupção, para qualquer efeito prĂĄtico, tornou-se legal no Brasil de hoje. O país foi reconquistado pelos corruptos de primeira grandeza e pelo universo que gira em torno deles. Com uma diferença fundamental em relação à situação de antes — quem roubava dinheiro público corria risco de ir para a cadeia, como foram os casos de Lula, Sérgio Cabral, Marcelo Odebrecht e tantas outras estrelas da ladroagem sem fronteiras. Hoje esse risco não existe mais. Alguém acha, honestamente, que o STF vai deixar que prendam Lula de novo — ou os seus ministros, ou os empreiteiros amigos, ou qualquer magnata desses que são defendidos por advogados do grupo "Prerrogativas"? Não foi para isso que colocaram Lula de volta na presidĂȘncia da República. O mundo da corrupção, agora, é 100% seguro – e nem céu é o limite.
NR. O povo brasileiro sofrido, honesto e trabalhador, cumpridor de seus deveres deve estar se perguntando se vale apenas ser honesto neste país.
Lula, um criminoso condenado em trĂȘs instâncias, com a ficha mais suja que pau de galinheiro, é descondenado pelo Supremo Tribunal Federal para concorrer a PresidĂȘncia da República, num dos maiores absurdos de todos os tempos, não só do Brasil, mas todo o mundo e, agora Sérgio Cabral, condenado a mais de 400 anos de prisão é colocado em liberdade. A pergunta que não deve estar sendo feita por muitos é: qual o próximo absurdo que o STF vai protagonizar neste país?
(J.R. Guzzo, publicado no jornal O Estado de S. Paulo em 21 de dezembro de 2022)
Fonte: Revista oeste